terça-feira, 23 de outubro de 2018

EPICA DA MISÉRIA


 

 

Resultado de imagem para IMAGENS DE IMIGRANTES
 
 
 
Os ninguéns: os filhos de ninguém, o dono de nada:
Que não falam idiomas, falam dialetos.

Eduardo Galeano.

 

 

            O século XXI tem sido marcado pela busca de novas terras por grupos de migrantes marcados, da mesma maneira que o século XIX e o XX. Não se trata mais da divisão internacional do trabalho, mas do deslocamento de parte da população sem rumo, expulsa por circunstâncias adversas. Tais como um terremoto como no Haiti, problemas políticos como na Síria ou no Senegal. As causas são variadas, mas os resultados são os mesmos são milhares de famílias deslocadas no espaço, sem a certeza da solução de seus problemas. São milhares de mulheres e de crianças à deriva da história. São milhares de famintos em busca de abrigo.

            Cada deslocamento maciço da população cria seus próprios mitos e suas próprias lendas. Não são os ricos os que são obrigados a deixar em massa sua terra, em geral são os mais pobres desvalidos e os excluídos sociais de um país. Os ricos  com seu dinheiro guardado na Suíça ,não sofrem com  problemas menores como falta de emprego e de comida. A falta de comida, de casa e de alimentação, de terra e de trabalho é que obriga os seres humanos a migrarem Os modernos heróis das viagens entre países não são os homens heroicos em busca da descoberta de novas terras, nem argonautas em busca do velo de ouro, mas apenas seres pobres sem destino.  A moderna epopeia da miséria trata apenas de famintos. Nada tão faminto quanto os imigrantes italianos que a partir de 1862 chegaram ao Brasil.No Rio Grande do Sul a grande imigração começou em 1875. Os relatos a seguir baseados em fontes primárias constituem parte da epopeia das mulheres imigrantes e pobres. O texto resulta de pesquisas realizadas entre 1991 e 2007,na Universidade de Caxias do Sul.,que resultaram em dois livros, As histórias de vida de mulheres imigrantes  que sozinhas tiveram de carregar a família e a propriedade.Sobreviver nas circunstancias em que viveram não deixa de ser uma história épica da pobreza.

 

 

 

 

 

 

 

 

IMIGRAÇÃO & MULHERES

Que não fazem arte faz artesanato.

Que não tem cultura tem folclore.

Eduardo Galeano


 

             A imigração italiana para o Rio Grande do Sul, o mais meridional dos estados brasileiros, aconteceu entre 1875 e 1914. Neste período entraram no Brasil mais de um milhão e meio de italianos para trabalhar na agricultura .

            Cerca de 100 mil imigrantes italianos vieram para o extremo sul. Vieram em busca de terra, vendida em lotes nas colônias, (loteamentos rurais) com área de 25 a 60 hectares, por preços baixos em módicas prestações mensais, com até 10 anos, ou mais de carência. Nestas terras situadas nas regiões mais inóspitas do Planalto Meridional brasileiro ,foram vendidos cerca de 10 mil lotes ,que forneceram  as condições de trabalho para os chamados colonos ( habitantes das colônias).

            A sociedade que se formou na chamada região colonial italiana do Rio Grande do Sul era similar a do campesinato do norte da Itália de onde eles vieram. Com uma diferença fundamental que é destacada por Paolo Rossato(DE BONI, p. 27.1977) em carta de 1884  a seus familiares italianos: ”Aqui nós somos senhores”. Já não dependiam dos condes ,eles se tornaram do dia para noite proprietários de extensões de terra maiores do que as que tinham seus dos seus antigos senhores. Eles se tornaram donos da própria miséria, não havia mais intermediários para explorá-los.

 Outra diferença é que as casas que foram aos poucos sendo construídas eram grandes sem as divisões dos cortile. As famílias viviam distantes umas das outras e independentes entre si. A miséria era a mesma, mas o futuro se apresentava melhor. Havia ainda outra diferença agora viviam nas matas e nas encostas pedregosas do planalto, vulgarmente chamadas de serras, não em vales de rios e planícies onde seria mais fácil plantar.

            Logo se formou uma sociedade nova nas terras do sul antes habitadas por fazendeiros criadores de gado, que viviam no planalto na região dos campos. A pequena propriedade vai marcar a paisagem, com as parreiras, as plantações de cereais, de frutas e de legumes. Eram pobres e sentiam como se fossem heróis conquistadores das matas que os cercavam.Logo se criou a mítica dos heroicos imigrantes que teriam desbravado a terra. Os novos heróis foram construídos pela miséria e pela sua expulsão da terra natal.

            Os homens eram fracos, pois pobres e mal alimentados. As doenças eram muitas para combatê-las não havia remédios nem vacinas. Havia o estranhamento da nova terra coberta de matas, com índios e animais desconhecidos. Havia o nunca superado sentimento de perda e luto da terra natal e dos parentes lá deixados.  A perda da língua que causou profundo sentimento de inferioridade para se comunicar deveria usar uma língua estranha.  Pelas circunstancias locais e pessoais, as mortes por doenças, as fugas e os suicídios não se fizeram esperar. Como resultado centenas de mulheres abandonadas.

Nos requerimentos à comissão das terras e mais tarde para as intendências municipais feitos pelas mulheres ou a seu rogo há histórias vida. nelas há  abandono , mortes.As   mulheres viúvas ou abandonadas contam suas histórias. Nem sempre são histórias edificantes há brigas, injustiças e luta pelas heranças. As mulheres justificam suas faltas de pagamento das taxas e dos impostos com a dura verdade ou com assentira mais descaradas.. São histórias de vida  nem épicas ,nem heroicas, mas de sobrevivência,.

Os requerimentos eram  encaminhados imigrantes e encaminhados aos órgãos que dirigiam a colônia Caxias seja a Comissão de terras seja a Intendência Municipal (Prefeitura).As fontes foram levantadas  s ao longo de três anos no Arquivo Historico Municipal de Caxias do Sul. A equipe coordenada por mim levantou cerca de 3 mil mulheres ,constante nos livros de registros dos impostos :Focolar,  de Conservação de Estradas e  de Indústrias e Profissões.

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 Os requerimentos assinados por mulheres demonstraram são  fontes importantes para entender a situação das mulheres viúvas, abandonadas pelos maridos ou casadas com maridos incapazes. Dos requerimentos brotavam histórias de vida. Sobre cada mulher proprietária foi elaborada  uma ficha contendo dados pessoais, endereço, profissão, condição da propriedade, filhos e situação do marido..

 

Foram catalogadas cerca três mil mulheres proprietárias de terra ou responsáveis pela terra e ainda as ocupadas em outros setores da produção como comércio, artesanato e indústria. Sobre cada mulher proprietária foi elaborada uma ficha contendo dados pessoais, endereço, profissão, condição da propriedade, filhos e situação do marido. Foram elaboradas 1400 fichas contendo seus  dados Foram elaboradas cerca de 1400 fichas contendo dados citados. Para a execução da pesquisa foram relacionadas 120 mulheres Das 120 mulheres,  foram selecionadas  30 ,a seleção  foi determinada pela existência de familiares das proprietárias  na região

 

 

A grande maioria dessas mulheres eram analfabeta, apenas 39% sabiam ler. Enquanto a maior parte das mulheres era de origem italiana, 77% do total, 20,4% eram do Império Austro-Húngaro e 2,6 % de Estados Alemães. Das mulheres de origem italiana 28% sabiam ler, as de origem austríaca 89% sabiam ler e 100%  das alemãs sabiam ler.

 

            As mulheres tiveram papel fundamental na construção da nova sociedade agrícola brasileira baseada no trabalho familiar, na pequena propriedade e na policultura.  Ao contrario da tradicional baseada no trabalho escravo, no latifúndio e na monocultura, seja do gado, do açúcar ou do café.

 

TRABALHO& MULHERES

 

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Que não têm cara têm braços.

Eduardo Galeano

           

 A mulher na pequena propriedade agrícola a mulher realizava a maior parte das atividades, 100% das atividades domésticas e mais de 50% das atividades principais e das atividades complementares A divisão do trabalho na pequena propriedade não tinha mesma clareza da divisão clássica do trabalho. Não são apenas as atividades externas para o homem e internas para a mulher. A análise dos depoimentos das mulheres revela uma divisão do trabalho desigual que não está baseada nem na necessidade da maternidade, nem na força física.  Está baseada na autoridade paterna. ”As atividades agrícolas exigiam grande dispêndio de forças físicas e mantiveram a continuidade de uma tradição familiar centrada na autoridade paterna.” (COSTA, 1982p. 49).

A mulher realizava a maior parte das atividades não lucrativas, sendo alijada das atividades principais, e que garantiam a maior renda para a propriedade. A mulher que realizava a maior parte dos trabalhos foi submetida dentro da família a uma condição subalterna, recebendo uma divisão desigual de bens.

            Quando a mulher ficava viúva ou abandonada pelo marido assumia a chefia da família, ao tornar-se dona da propriedade, a mulher assumiu e diversificou as atividades principais da propriedade. A mulher ao se tornar dona da terra transforma-se assumindo as posições que antes eram as do homem, garantindo tanto a manutenção da submissão das mulheres como a da família tradicional.

            Por outro lado a transformação da esposa em dona da terra é mais profunda e traumática do que a do pai de família de servo se tornou senhor Acostumada à submissão e educada para obedecer, em produzir e em reproduzir sem maiores questionamentos, a mulher que se torna proprietária de terras deverá encontrar sua identidade como pessoa. Voltada para a criação dos filhos, para os cuidados do lar, o trabalho nas atividades complementares, alijada da administração da propriedade e da gestão econômica da mesma, deveria de forma imediata adquirir nova posição e novos conhecimentos.

            Ao se tornarem donas das terras as mulheres mantêm a discriminação contra as filhas mulheres, julgando-as incapazes de auxilia-las na administração da propriedade. Nos requerimentos, a inexistência de filhos homens é apresentada como uma impossibilidade de produzir para pagar os impostos. Como é o caso de Tereza Bolzanello  e Regina Mattana em requerimentos de 1903, alegam que como tem filhas mulheres não podem pagar os impostos.

            Imitando os homens, desprezam e segregam as filhas à segregação que haviam recebido, reproduzindo a injustiça a que eram submetidas às mulheres, mantendo-as sob a pressão de um trabalho desigual e sem direitos iguais aos dos homens Entre os vários casos estudados está o de  Apolonia De Boni, viúva de Antonio Cambruzzi, residente no lote 2, Linha Jacinta, X Légua, casou-se em segundas núpcias com Sebastiano Casagrande, recusou-se a entregar a herança  devida a sua filha Ângela Cambruzzi que vivia na miséria em Nova Pádua, com seu marido Giovanni Menegat. Algo semelhante parece ter ocorrido com Margaritta Lira, abandonada pelos filhos e casada com Giácomo Fiorese,   requerimento de 18 de maio de 1903.

 

 A principal função  da mulher era  ser  uma serviçal,cujo  papel fundamental era o da reprodução. Sem conhecer o modo como os filhos eram gerados, entravam para a vida de casadas sem qualquer tipo de preparação.. Os depoimentos de mulheres imigrantes revelam de forma clara o choque que o casamento e as relações sexuais dele decorrentes causavam nas recém-casadas. Sem ter qualquer orientação, sem saber como eram gerados os filhos encaravam o sexo como uma prova da força do homem sobre sua integridade física. A saída da mais completa ignorância através da brutalidade física causava traumas, que voltavam a aflorar n amais provecta idade.

            Ao nascerem os filhos, sem assistência maior do que a de vizinhas ou de parteiras práticas, a mulher voltava a trabalhar em poucos dias. “Depois de quatro dias ia-se à roça capinar” (Costa 1982, 49) não é, pois de estranhar, a ocorrência de nascimentos prematuros e de mortes dos nascituros. A “quarentena” e o resguardo após o parto era privilégio de poucas, ao aleitamento somava-se o trabalho da casa e as demais atividades da propriedade. Não é de se estranhar o grande número de crianças que morriam antes de completarem um ano de idade, nem o elevado número de abortos evidenciados nos registros de óbitos como fetos. Algumas mulheres passavam do aleitamento para nova gravidez. “Minha mãe fez vinte dietas e vinte quarentenas. Cada ano uma criança.” (idem).

            O lazer da mulher era o trabalho, isto é, a mudança do tipo de atividade. Lazer podia ser bordar ou remendar roupas, fazer tranças de palha, ou dobrar palhas para o cigarro usado pelos homens. As poucas festas que participava estavam ligadas não só a família ou a Igreja como também ao trabalho. A comida servida nas festas era feita pelas mulheres, geralmente servidas por moças. Após a adoção do churrasco como prato principal foi que os homens passaram a trabalhar na feitura dos assados, passando as mulheres a servir as mesas.Segundo  Moretto   “ as mulheres sempre faziam algum trabalho manual que lhes rendesse algum dinheiro e assim compraram o que necessitavam.” (MORETTO, 1991,p.75)Já que não podia contar com o dinheiro que a propriedade rendia,este era exclusivamente dos homens.

O nascimento de uma filha mulher era considerado como um ônus para a produção agrícola, mas, por outro lado, era o início de uma vida de trabalhos, auxiliando a mãe nas infindáveis atividades de casa, e o cuidado com os irmãos menores. A chegada de uma filha era acompanhada com a preocupação do dote e do enxoval. Não se trata aqui de discutir a maior ou menor força da mulher em relação ao homem, mas de constatar que as mesmas mulheres que afirmavam sua falta de força física, terem conseguido dirigir e trabalhar sua propriedade por mais de vinte anos, sem o auxílio do marido ou de filhos.

            A fraqueza desta forma parece ter sido um estereótipo atribuído pelo grupo social ao sexo feminino, e aceito pelas mulheres cuja própria vida encarregou-se de negar. A mulher provou que tinha condições físicas necessárias para o trabalho físico que a lavoura regional exigia.

            Algumas mulheres proprietárias mentem em seus requerimentos, informam  que vivem na mais extrema miséria, que não têm homens que as auxiliem, e que não podem pagar qualquer tipo de imposto. Este parece ser o caso mais comum dos detectados como o de Bortola Viecelli, Magdalena Trentin  e Margherita Lira. Muitas vezes a falsidade das afirmações é desvendada pelo inspetor ou por outros requerimentos. Algumas viúvas que têm 65 anos afirmam ter  os filhos menores de idade.

 

 

 

 

EXEMPLOS HEROICOS?

Que não são seres humanos, são recursos humanos.

Eduardo Galeano


            Nas histórias das mulheres abandonadas há um pouco de tudo, mas o que mais há é esforço e superação. Suas histórias guardadas dos requerimentos podem ser contadas por lembranças familiares ou algum registro oficiais da imigração. Os portugueses eram afeitos a burocracia e ao registro,os brasileiros herdaram tais hábitos. Assim cada colono entrado merecia uma anotação em mapas estatísticos onde constava a procedência a data de chegada , a idade de cada membro da família,grau instrução e o lote que lhes foi designado.  Assim a partir destes fragmentos, restos de algumas vidas podem ser encontrados.

            Catarina Cavagnolli, 35 anos, chegou ao Brasil em 1877, casada com Giovanni, 46 anos. Tiveram  quatro  filhos e duas filhas.O mais velho de seus filhos Carlo ,tinha 11 anos e Rosa mais nova  ,tinha 2. Em nove anos ela ficou grávida seis vezes. Segundo os dados do registro o lote Nº 53, na X Légua tinha 23 hectares.(GARDELIN,2002,p.348)

             Em 1893,quando ficou viúva tinha 51 anos, seus filhos estavam criados. Ela vivia no lote 51 do Travessão Felisberto da Silva, na X Légua da antiga colônia Caxias.No ano seguinte ela quita o lote em que vivia  Poucos anos após ( em 1905),tinha  registrados  mais três  lotes, no mesmo Travessão, número 45, 50 e 51. Assim depois que ficou viúva conseguiu  comprou mais três lotes de terra ,cada um deles  com cerca de 20 hectares.

             Em 1898, aos 55 anos, empreendeu mais um negócio.Resolveu se  tornar  tropeira. O  trabalho de tropeiro consistia em transportar mercadorias de um lugar para outro.Era trabalho masculino, sendo pouco recomendado às mulheres,pois tinham que deixar suas casas e seus filhos. Catarina  informou à Intendência que pretendia trabalhar com uma tropa de seis mulas, para “ transportar mercadorias dos comerciantes para fora e para dentro da X Légua”(Requerimento de 1903) Solicitou ser lançada no registro de Indústrias e Profissões não como comerciante,mas   como proprietária de tropas. Apesar de não haver registro de .Catarina Cavagnolli  como comerciante é possível que tenha tido uma casa de comércio. Outras mulheres possuíram tropas,mas não se registraram como tropeiras entre elas  Ana Rech e  Cezira Oliboni

             Mais de cem anos após sua morte seus descendentes ainda lembram da mal falada  antepassada,segundo  suas lembranças uma mulher de vida fácil.

            Ana Rech é a mais conhecida das mulheres proprietárias .Em Caxias o lugar onde ela tinha sua propriedade levou seu nome.O distrito de Ana Rech, hoje se tornou um bairro da cidade de Caxias do Sul.  

            Ana Rech chegou ao Brasil em de 1877,no meso ano que Catarina Cavagnolli. No mesmo  ano  entraram cerca de quinhentos  imigrantes provenientes do Reino da Itália.Ana Rech era apenas  uma  mulher baixinha e  viúva  de 49 anos perdida   numa multidão  de pobres em busca de terras no sul do pais. Nasceu em Pren no dia  1º de outubro de 1828. Aos 19 anos  casou-se  com Osvaldo Rech ,de 25 anos, natural de Muner, ele  como ela  era  filho de agricultores sem terra .Em  20 de novembro de  1847,  mudaram-se para  Pedavena ,onde nasceram  seus  nove  filhos: ( Dall’Alba,1987, p48)  1865. A vida do casal de meeiros era muito difícil,  alimentação era precária  daí as péssimas condições de saúde dos filhos.

            A vida do pobre não é uma epopeia,mas tem todos os componentes de uma   tragédia. Em 1868, a filha de Ana, Maria Teresa se casa com Pietro Menegat morrendo quatro meses depois. (Dall’Alba,1987   p. 42) Os anos de 1875 e 1876 foram os mais difíceis para os agricultores, as péssimas safras ameaçavam matar de fome parte da  população. A situação se torna  grave com a morte de Osvaldo, de uma hérnia abdominal , na véspera do natal de 1875.

            Foi então que Ana  decidiu emigrar . Conta-se  que  ameaçou  se suicidar  se não fosse permitida sua saída da Itália assim substituiu por uma pessoa solitária.(GARDELIN, 2002,p.282 e seg.)Partiram  em  12 de outubro de 1876 (Dall’ Alba II p.40) numa  viagem  durou meses. Não  se tem noticia do navio  em vieram mas as lembranças da viajem forma preservadas. Entre elas a queda do trem de seu filho  Giuseppe e de como foi salvo. De como  morreu   Osvaldo Rech  foi atirado ao mar depois de sua morte súbita. .De como fugiram as mulas  que transportavam seus  dois filhos mais novos.

            Após sua chegada em Caxias, Ana encaminhou  um oficio à Diretoria  de Terras solicitando  ser colocada em lote situado ao lado do  de Ângelo De Carli. As duas famílias  Rech e De Carli mantinham relações de amizade e de  casamentos durante muitos anos.   Comprou  o   lote  nº104 ,no travessão Leopoldina  ,VIII Légua , situada a meio   caminho entre a região dos campos povoada por lusos e as terras destinadas à colonização pelo governo brasileiro . Logo após sua chegada em Caxias, Ana encaminhou  um oficio à Diretoria  de Terras  solicitando  ser colocada em lote situado ao lado do  de Ângelo De Carli..

            Há muitas lembranças  sobre Ana Rech , o que é certo que abriu uma casa de comércio com águas e campos para as tropas, ficou conhecida como a dona da melhor casa de pasto da região. Em torno de sua casa aos poucos são construídas outras casas e logo o povoado se  forma.Há muitas histórias sobre Ana Rech desde suas relações com escravas ,tendo tentado criar a filha uma delas,bem como  de suas relações com Ângelo Rech , de seus filhos doentes . O  que  realmente importa é que conseguiu vencer no novo mundo marcou com seu nome um lugar e deixando numerosa descendência .

Os requerimentos abaixo feitos por Ana Rech , servem para mostrar como era  nlese apresentada a a voz das colonas :

 

Aos vinte e sete dias do mês de outubro de 1881 apresentaram-se nesta diretoria Anna Rech e RECH Angelo, que declararam na presença do diretor João Maria de Almeida Portugal e de testemunhas assinadas e nomeadas ,que no dia dezenove do corrente mês ,a uma hora da noite encontraram uma criança do sexo feminino na porta de sua casa na 8ª légua prazo nº 104 ,sendo logo pela mesma Anna Rech recolhida ,cuja criança ,por ele foi declarada que tinha levado à igreja no dia de hoje ,sendo batizada e feito o registo pelo padre Agostinho Magon. Foram padrinhos Angelo e sua mulher Joana Rech. O que  para constar   lavra-se o presente termo que vai assinado por

Por Angelo Rech e pelas testemunhas Rech Angelo, e pelas testemunhas Eng. Afonso Newton de A. de Figueiredo, Gil Correa Vianna e Giuseppe Falavigna. E eu ,Paulo de Campos Cartier auxiliar  de escritório que o escrevi.

 

 

Aos 13 dias do mês de junho de 1882 apresentou-se nesta Diretoria a colona Anna Rech que declarou que no dia 13 (ou 14)   de maio corrente faleceu a menina Maria Joana com sete meses de idade ,cuja criança foi por ela recolhida a a19 de outubro, a qual foi sepultada no cemitério da 8ª Légua desta colônia, em cuja légua mora   a declarante. Do que para constar lavrei este termo que comigo assina a rogo a declarante por ser analfabeta, Luiz Valdemar Voght e as testemunhas Adolfo Aurélio de Figueiredo e Rafaele Buratto. O ajudante de escriturário Paulo de Campos Cartier.

 

 

 

             Luigia Grossi ao contrario de Ana Rech e Catarina Cavagnolli ,residiu na zona urbana, na vila de Caxias, na Praça  Dante Alighiere  a principal da Vila .  Seus pais  Francesco Boscato(55) e   Margherita (48 anos) deixaram a Itália como emigrantes.  Chegaram à colônia Caxias vindos de Thiene,( Vicenza) a  no dia 17 de junho de 1882, vieram  com dois filhos Ângelo de 13 anos e Lúcia de  9 anos,. Na Itália deixaram outros 4 filhos: Pietro(27 anos ), Regina( 25 ), Angela( 22 )   e Luigia com 18 anos. O motivo da separação são desconhecidos, sendo possível que os filhos que ficaram na Europa estivessem trabalhando para  juntar algum dinheiro para vir para o Brasil ao encontro dos pais.

       Dois anos depois em 22 de março de 1884 chegou Pietro, o filho mais velho,  casado com Maria Madalena Conforte.  Com ele vieram duas de suas irmãs   casadas, Regina Boscato Braga e Ângela Boscato Giacomo.  Luigia  permaneceu  em Milão ,onde trabalhava. Segundo lembranças familiares estaria noiva. Ao que se sabe  Luigia Boscato encontrou  Baptista Grossi  na cidade na qual moravam. Ao conhecer Baptista, Luigia rompeu  o noivado  casando-se  com ele.  Segundo as lembranças familiares ele era  um " bon vivant".Era  baixinho e gordo enquanto Luigia era bem mais alta.De acordo com as fontes ele era solteirão ou separado da mulher,  bem mais velho do que a esposa.

            Fazia nove anos que os pais tinham deixado à Itália quando a filha e seu marido . decidiram  vir ao Brasil, chegando   em 15 de agosto de 1891.  Baptista tinha então   39 anos e Luigia 28 anos.  Ao chegarem à vila sede do recém-emancipado município de Caxias, compraram o lote número nº 1, da quadra 42, Situado na esquina das ruas Sinimbu e   Marques do Erval. O lote pertencera  ao sapateiro Giovanni Faccin, que o adquirira em l882,que nele havia  construído uma casa de madeira. O lote   ficava ao lado do lote nº 3 que pertencia a  Giuseppe Eberle e no qual Gigia Bandera tinha sua funilaria.  A  compra de um lote situado na praça principal da Vila revela que possuíam dinheiro para a compra,pouco tempo depois construíram um novo  hotel, primeiro prédio de  três pavimentos da região.Baptista deveria ter acumulado  capital antes de viajar para o Brasil.

            Segundo seu neto  João José Batista Grossi,  o hotel de sua avó  tinha  30 quartos com um banheiro e dois sanitários por andar. No térreo ficava o salão de refeições,   a cozinha se  localizava na antiga casa de madeira ao lado da qual o hotel foi construído. A família morava no primeiro pavimento desta casa.    O hotel tornou-se famoso pela tripada que era servida aos domingos. Os colonos que vinham à missa aos domingos aproveitavam a ocasião para fazer suas compras nos quiosques da praça e comer no hotel “del coggo."

              O casamento parece ter sido feliz. Enquanto Baptista se encarregava da parte social do hotel, Luigia assumiu a direção dos empregados e da cozinha. O casal teve  cinco filhos no período entre 1892 e 1899, Alberto, Vitória, José, Francisco e Margherita.Segundo memórias familiares Luigia ficava cozinhando praticamente até a hora do parto para voltar à  atividade   logo após. Luigia  mulher dinâmica controlava as finanças familiares com a mesma energia e controlava os filhos, mesmo depois de adultos. A imagem guardada de Baptista é outra, dedicava-se mais ao contato com o público não sendo muito afeito ao trabalho.

            De 1893 a 1895 o  Rio Grande do Sul sofreu um período de conflito interno  conhecido  como Revolução Federalista. O conflito foi decorrente da situação nacional  onde as lutas entre os monarquisitas  e republicanos ainda se travavam,na capital da nova Republica.Os maragatos ( monarquistas ) usavam bandeiras de  cor vermelha,os chimangos(republicanos ) as de cor branca. Os dois grupos enfrentavam-se  na luta pelo poder dirigente   do estado gaucho. Em temos de ‘ revolução’ os hoteleiros enfrentavam momentos delicados, as vilas e cidades eram invadidas  por tropas republicanas  e logo a seguir  por tropas federalistas.. Outra grande revolução ocorreu entre os dois grupos em 1923, em ambas foram  do imigrantes os mais prejudicados pois só eles plantavam, colhiam  e criavam animais domésticos.As safras e os animais eram roubados.Havia morte e colonos eram obrigados a participar das lutas.

            O mesmo não acontecia nas vilas e cidades,onde o objetivo era estratégico e não apenas de saques como na zona rural .Luigia  usava   a estratégia de mudar a bandeira conforme a facção dos  soldados que vinham ao hotel para fazer as refeições.Devido    à artimanha da   troca de bandeiras  ,tanto maragatos como chimangos nada fizeram contra o hotel que foi preservado .

      Na vila de Caxias onde não existiam clubes e residências que possibilitassem a reunião de mais de cem pessoas era costume realizar as festas em hotéis. Além do trabalho diário no hotel Luigia ainda tinha ocupação nos finais de semana com esse tipo de festa.   Foi exatamente durante uma destas festas mais precisamente o do casamento de Érico e Celestina  Raabe em 1905 que repentinamente Baptista morreu. Tinha então 53 anos deixando Luigia viúva aos 42 anos com cinco filhos menores.    Após a morte do marido Luigia continuou com o hotel. . Em 8 de maio de 1907 Luigia cobrou da Intendência através de requerimento a quantia de 220$500 reis pela comida fornecida aos presos pobres da cadeia municipal. O requerimento foi deferido tendo Luigia recebido o solicitado. Há muitos requerimentos  seus com mesmo teor  cobrando serviços prestados ao município. 

            Com o capital conseguido com o hotel em 9 de abril de 1913 Luigia solicita a comprou de uma sobra de terra existente entre o lote 1 e 3 pertencente a Abramo Eberle " afim de poder efetuar pronto pagamento pelo preço que estipulardes." Em 4 de julho do mesmo ano solicita licença para construir um sobrado de madeira na área que havia adquirido.   Foi nesse mesmo ano que alugou uma casa situada na esquina da rua Marques do Erval com a rua Os Dezoito do Forte onde passou a morar com seus filhos enquanto a casa da Sinimbu estava sendo construída. Decidiu  também alugar o hotel passando a viver de rendas.

             Segundo o que sua filha  Rita contava aos seus filhos passou muito trabalho tanto no hotel quanto para criar os filhos, deixando  uma imagem de mulher, de poucas palavras e que batia só necessário. Passou por dificuldades financeiras conseguiu administrar suas finanças.Segundo lembranças ,ela morreu  o no dia em que conseguiu pagar  sua última dívida.

            Ermelinda Viero nasceu na II Légua em 1893  . Seus  pais imigrantes , vieram de Villaraspa, Vicenza. Andrea,  era marceneiro,  abriu sua  oficina na II Légua .Ela  estudou da localidade , na   escola   da professora Candinha Bay, em São Pedro da III Légua.. Ermelinda era inteligente e boa  aluna , após terminar a " Seleta " ou seja o curso elementar, foi convidada para ajudar a professora.  Ela arrumava  o material didático, cuidando que as lapiseiras tivessem sempre grafite apontado, e as lousas limpas. Depois de algum tempo trabalhando na escola, Ermelinda voltou para casa,pois queria ser costureira e não professora. Foi  para  Caxias  na casa de parentes onde trabalhava como doméstica., de manhã fazia os   serviços da casa e entre outros matar as galinhas para o almoço. . A tarde aprendia corte e costura com Maria Bragagnollo,depois de aprender corte e costura Ermelinda voltou para a III Légua onde passou a costurar. Foi aí que encontrou Matteo Carlo Gianella.

Ermelinda  era alta, pele clara, sardenta com cabelos vermelhos escuros e olhos castanhos . Matteo Carlo nasceu em 1883, sendo um homem bonito de cabelos pretos, olhos azuis e farto bigode, natural de  Crocemosso, no Piemonte.  A vida de Matteo  que era órfão foi difícil . Criado em orfanato, aos  seis anos, começou a trabalhar numa tecelagem emendando fios. Muito jovem ainda imigrou para a Argentina. Em Buenos Aires tentou vários empregos sem muito sucesso, não conseguindo trabalhar em tecelagem como era seu desejo. Encontrou Ercole Galló em  Buenos Aires,  quando trabalhava no porto como estivador,;Gallo convidou-o  para trabalhar em sua tecelagem no Brasil. Em 1913 Matteo deixa Buenos Aires , e durante alguns anos trabalhou na tecelagem de Gallo ,no Profondo (hoje Galópolis) 

Foi numa festa  de padroeiro da  capela de São Pedro  que Ermelinda e Matteo se conheceram.  O namoro entre os dois foi difícil, pois sendo Matteo bem mais velho que ela, seu pai julgava que era casado na Itália.  Pôr outro lado Matteo tendo vindo de Buenos Aires  e sendo  do Piemonte era considerado um estrangeiro. O casamento realizou-se a 4 de março de 1915 na Igreja Matriz da Paróquia de Santa Tereza de Caxias. O casal foi morar em Galópolis. Onde Matteo era contramestre da fiação, onde  tinha  direito a uma casa de material  da vila operária pertencente ao lanifício.

Matteo precisava de aumento, o que foi lhe  negado,sendo dito  que estavam chegando da Europa muitos operários que trabalhariam por um prato de comida.  Com a recus , Matteo deixou o emprego  foi a Monte Bérico, onde com a família morar num galpão pertencente a Giovanna Perin, onde nada pagavam.  Foi que ele começou a produzir "carona", (peça utilizada na montaria feita com a lã ) com a lã que Ermelinda retirou do colchão. A " carona" foi vendida para a casa comercial de Abramo Eberle que reclamou  da baixa qualidade do produto, indicou onde Matteo poderia comprar lã e prontificando-se a comprar sua produção. O comerciante sugeriu ainda que as caronas fossem  decoradas com flores pois assim venderiam melhor. Ermelinda era desenhista de flores passou  a desenhar e bordar as caronas destinadas ao comércio. A feltraria se desenvolveu sendo adquiridas as mesas de agitação destinadas  aglutinar ar fibras  da lã.

A partir de 1920 a empresa se desenvolveu e Ermelinda além de cuidar da produção também cuidava  da escrita da tecelagem ,além da casa e dos  seis filhos que teve, Com o aumento da produção foram contratados operários. Em 1925 já são cerca de cinquenta sendo a maioria mulheres.Matteo  viaja muito  para vender seus produtos, lã em novelo, cobertores tipo mostarda e capas, além das "caronas"..Ermelinda com as viagens do marido tomava conta  não só com da contabilidade como da produção auxiliada pôr seu irmão . O casal morava em  casa situada próxima a fábrica e  Ermelinda cuidava da sua  segurança. Durante a noite, com cuidava da empresa uma arma ,  disparava para o alto quando julgasse ser necessário. E em casa ela tinha um chicote pendurado atrás da porta para manter  a disciplina dos filhos. Era severa, sabia se impor, não precisando levantar a voz. Bastava pegar o chicote..

Ermelinda não tinha pela casa o mesmo interesse que tinha pela empresa. Como o local onde a família morava era distante do centro de Caxias, as crianças eram levadas de charrete para a escola, os meninos no Carmo e as meninas no São José, pôr um encarregado que as levava e as trazia de volta para casa. Todos os filhos estudaram;

Matteo fez   várias viagens a Europa, não só para a compra de máquinas como também para visitar parentes, mas  Ermelinda nunca o acompanhou. Anos mais tarde Matteo foi com o filho Dwiglio para a Itália onde este realizou um estágio em uma tecelagem de Biela.  

A ação de Ermelinda não se restringia a empresa. Várias de suas ações dirigiam-se para aqueles que passavam dificuldades, operários ou não da tecelagem. Sabendo que uma família passava necessidades levava ranchos e roupas. Um dos casos que ainda é lembrado é de uma moça  que ficara tuberculosa e que os vizinhos fechavam as janelas com medo  do contágio da doença. Segundo lembranças de Paulina Moretto, Ermelinda participava também nas atividades da escola, visitando-a junto com os inspetores de ensino nas festividades de fim de ano. Era enfim uma personalidade pública.

Em 14 de novembro de 1942 aos 59 anos Matteo morre de  problema cardíaco. Ermelinda continua morando na casa próxima da empresa a,mesmo após o casamento dos filhos. Continuou com suas atividades na fábrica, dirigindo-a. Pouco tempo depois da morte do marido, Ermelinda ..Ao que tudo indica é Ermelinda nunca quis  se afastar da empresa ,sendo ainda jovem quando ficou viúva nunca deixou o trabalho, nunca abandonou a empresa.

Até a sua morte ocorrida em 2 de julho de 1969  causada também por problemas cardíacos, Ermelinda continuou  trabalhando. A razão social da empresa após a morte de Matteo passou a ser Viuva . Matteo Gianella & Filhos.

 

 VOZES DAS MULHERES

            Nas cartas  e  nas memórias escritas pelos imigrantes as vozes das mulheres não são ouvidas. Nos Appunti di Viaggio , de Giuseppe Dall’Acqua,  A  mais completa narrativa  de viagem  de imigrantes chegados ao Brasil ,  redigida durante a viagem e  publicada em 1901, há apenas duas citações da presença da  mulher.O  nome de  uma  mulher é citado na epigrafe,dizendo que veio com ele e sua família é a sua mulher  Ana Bonfardin.A outra  Ana Dal’Acqua  sua cunhada pediu a um marinheiro ,que  um pouco do  queijo estragado que era dado as ovelhas um pouco dele fosse  dado  a seus filhos.   

             Há poucos testemunhos diretos das palavras de  mulheres imigrantes.Elas   não tinham  direitos, nem  voz. Não podiam receber lotes rurais. Ana Rech foi uma das exceções .Por outro lado os homens imigrantes foram pouco ouvidos.Sua voz esá nos veros fesceninos que cantavam  depois de beber, em alguns provérbios e em pequenas anedotas que contavam. A voz das  das mulheres em geral está escondida nas  receitas culinárias, nas das cura de doenças  a nas  rezas.Nelas há mais descrições que vozes reais.

            Entre os poucos discursos conhecidos estes estão  os testemunhos recolhidos por Rovilio Costa e Arlindo Battistel  em dialeto de difícil tradução .Um dos testemunhos é de Brígida Chiarentin  Tessaro ,entrevistada em 1977 com 92 anos, ela conta  como foi a viagem  e a vida  nos primeiros tempos de sua chegada ao Brasil::  

                                           Mi sono vegnesta de l’Italia cô ghea sei ani compidi.(...) La nostra famiglia se zera de Padova ,la terra de Sant’Antoni.Me ricordo che se passava l’inverno te le stale de vache parche i animai i rendea caldo. La nostra famiglia se zera de sei persone.El viaio le mia stato tanto bel.Vênti i tampeste,ma grassia a Dio,el bastimento  se ga mia sfondá.El viaio el gá dura quaranta di.Ghemo desmontá a Rio deJaneiro.Dopo  4 giorni semo vegnesti a Porto Alegre, i dopo semo andati a Cassias tel Baracon de imigranti.( Costa ,1983 .p.981)

               Ela conta ainda  de como chegaram ao lote a eles destinado  em  Antonio Prado e como os animais da florestas que ela chama de “la tigre” comiam os animais domésticos. Os colonos chamavam de tigre  aos animais selvagens que atacavam so cachorro e os galinheiros.Conta ainda das doenças familiares e das irmã que foi comida pela tigre

                     Sô mama la gá mandado sorelete sue tor impréstiofarina par far la polenta te un vizin.A metá starda la pio picola la gá dito:”vá ti sola tor la farina che mi te espeto qué”.L’altra la andata ,ma   tes a  volta no a trova la picinina.La core a caza e tuti i corre in cerca .Anca i vizigni com faconi.i scopi parche il saveva  che podea eser sta la tigre.In fati. I gá spaura sta tigre,ma a tozeta no i a pi catada ,la tigre la gávea bel che magnat.”(Idem )

Ao nascerem os filhos, sem assistência maior do que a de vizinhas ou de parteiras práticas, a mulher voltava a trabalhar em poucos dias. “Depois de quatro dias ía-se à roça capinar, não é, pois de estranhar, a ocorrência de nascimentos prematuros e de mortes dos nascituros. (Costa ,1982,p.245)

Algumas vozes esparsas sobre assuntos diversos podem ser acompanhadas a seguir .Sobre o nascimentos dos filhos

Outro depoimento de Angela Borsa conta  sobre o  dia nascimento de sua filha Rosina :

Go laorá tuto el di  in tea rossa,go taia mato insieme a mi omo fin sera.Co zé oto de la note .a go bio mi sola.Noantri iéramo distante dela partera lora Fiorindo me omo no gá fato ore ndare ciamarla. (COSTA, 1983,p.880)

 Ao nascerem os filhos, sem assistência maior do que a de vizinhas ou de parteiras práticas, a mulher voltava a trabalhar em poucos dias. “Depois de quatro dias ía-se à roça capinar, não é, pois de estranhar, a ocorrência de nascimentos prematuros e de mortes dos nascituros(COSTA,  1982,p. 117.)

 

Sobre o trabalho feminino  :

Viviam trançando a palha. Cortavam ainda e dobravam a palha de milho usada para confecção de cigarros. Os produtos vendidos rendiam o necessário para o enxoval.Quando queríamos comprar alguma coisa, era um sacrifício. Tínhamos de fazer uma rocinha depois pegávamos o milho e vendíamos.”( COSTA , 490)

 

Com cinco anos comecei atrabalhar .De mnhã cedo na roça.ainda escuro, ficávamos lá até anoitecer (COSTA p.507)

Depois que ficávamos grandes fazia-se o trabalho da casa,e depois ia-se dar sulfato à parreiras,com a carroça trabalhava e com o gadanho;Lavrar eu sempre lavrei,comecei a puxar serrote com nove anos (p.152)

 

 

Outra lembrança de filha de colona imigrante:

      Levantava-se ao nascer do dia , as vezes ainda no escuro.Tratar das vacas,os poços e depois ir à roça a comida tinha de preparar tudo antes de sair .deixava-se  em casa os filhos  pquenos ou os levava juntoas onze voltava para casa a meio dia retornava. A noite voltava-se cedinho com o claro do dia.Fazia os trabalhos,ordenhava as vacas .De noite costurava  e fazia as tranças de milho.(Costa ,621)

            Sobre as condições de vida dos primeiros tempos  no Brasil há muitos depoimentos .” Disse uma :Eu levei um dote tão miserável. Quem comprou foi a mãe. Pouca coisa: 4 lençóis, 20 ou 3 toalhas, dois ou quatro travesseiros.” (COSTA , 490)

           

            Outra depoente informa Quando nos casamos levamos somente roupas de cama e de vestir. Não levamos louças, nem máquina de costura,que era uma peça que devia constar do enxoval. (COSTA, 1982, p.490)

 

 

Comprei a máquina de costura com as palhas de trigo,lá ficavamos a fazer palhas para ganhar 6 contos para comprar a máquina de costura, a custa de palhas e de tranças. (COSTA, 1982,p.509)

 

 

Alice Gasperin filha de imigrantes relembra :

No inverno, que era sempre rígido e extenso, se reuniam em estábulos, tanto de dia como no serão. As mulheres fiavam. As famílias numerosas tinham os seus teares manuais e faziam seus tecidos, especialmente de linho, tanto para vestir-se como para roupa de cama. Faziam meias, costuravam tudo a mão e consertavam roupas. Os homens se dedicavam ao artesanato de madeira. Faziam baldes, estátuas de santos, molduras, soldas, etc... Aprendiam um do outro. Gasperin 1984 P,.13)

 

Tal afirmação foi reforçada por Paulina Moretto também filha de imigrantes “as mulheres sempre faziam algum trabalho manual que lhes rendesse algum dinheiro e assim compraram o que necessitavam.” (MORETTO,1991,p.13)  

 

            Alguns trechos de requerimentos tratam da fragilidade e da falsidade femininas .Maria Sensolo ,residente  na Barra ,do 4 ºdistrito infoma em 26 de setembro de 1905, que

 

seu marido Fiorindo Sensolo,  a pouco tempo teve a desgraça  de cair dentro do Rio das Antas afogando-se,ela se acha com 5 filhos menores ,pobre e sem meios de pagar as su as dívidas .

 

 

Rosa Laner, moradora da II Légua solicitando  à Intendência a isenção do Imposto Pessoal  diz “que tendo apenas uma filha em sua companhia e sem forças para cultivar”[1]. Informa Enricheta Casiraghi, moradora da II Légua, que  “sendo viúva, com cinco filhos menores, lhe falta  força para o trabalho”.[2]Em requerimento datado de 12 de julho de 1902  informa : "Bortola Viecceli, viúva de Antônio Viecceli, moradora do lote 11 do travessão Victor Emanuel, VIIª  Légua, tem 64 anos e sete filhos menores que nem um auxílio podem dar, pede isenção do imposto de melhoramento de estradas.” A voz de Bortola está por trás da voz de quem escreveu o requerimento

O inspetor do Travessão informa ao Intendente que Bortola tem os filhos adultos que a auxiliam no trabalho, dizendo que o pedido deve ser indeferido.

            As vozes das mulheres que com seu trabalho  ajudaram a fazer a  América estão  dispersas nos requerimentos , elas  que nunca poderão ser ouvidas.

           

 

 

 

 

CONCLUSÃO

Que não aparecem  na história universal,

aparecem  nas páginas policiais da imprensa local

Eduardo Galeano

 

           As mulheres foram excluídas da história da imigração italiana no sul do Brasil, da mesma forma que o foram na história brasileira. Quando seus nomes são  citados estão ligados aos maridos. Elas não tem  nome,sendo chamadas pelo dos maridos  como viúva de ,por exemplo Viúva João Triches. A exclusão das mulheres nos fatos históricos e nos  relatos não é coincidência.Pois a sua vida e a sua  história sempre foram  vistos e escritos pela  ótica masculina.   

            O subintendente de Nova Trento em 1898 ,ao encaminhar  requerimentos de viúvas pobres as apresentou da forma que segue:“Os pedidos feitos pelas viúva , Luigia, viúva Franchetti, e o pedido verbal feito a mim de Bersabea, viúva Prandi, doente de treze anos com os filhos menores, merecem ser atendidos.” A forma utilizada pelo subintendente  se repete no decorrer do tempo.

As mulheres pobres não  tem direito ao sobrenome do marido, não possuindo o reconhecimento do seu próprio sobrenome.

Em requerimentos do ano de 1898 ,Cecília Pirondi  se apresenta como viúva de Giobbe Canani.Neste mesmo  ano Ângela Sandi  e de Enricheta Casiraghi ,conseguem elaborar  seus  requerimentos sem dizer seus nomes .A   primeira informa que é viúva de Carlos Sirtoli, e a segunda que é viúva de Antonio Rosseto. Nos requerimentos posteriores voltam ao nome de solteiras, com um detalhe deixam   de se referir seu estado civil.  Os requerimentos são feitos  como proprietárias dos lotes que  dos quais se tornaram proprietárias pela morte do marido.

             A questão do nome é uma questão de identidade ,por ela  a mulher se reconhece como ser livre e como proprietária de terras.Só aos poucos ao longo dos anos  vai se distanciando da precedência do nome do marido, retomando o seu nome de solteira. Ao assumir o nome de sua própria família, passa a negar o nome da família do marido. Ao se identificar como ser humano livre, nega as relações de submissão que o sobrenome do marido representava

                         

 

             Não é de estranhar que as mulheres sejam ignoradas em seu papel de pobres e imigrantes. Não faz muito tempo que os primeiros relatos da participação da mulher na Segunda Guerra começam a ser feitos. Ainda assim “Já no século IV A.C em Atenas e em Esparta, havia mulheres lutando nas tropas gregas”(ALEKSIÈVITCH,2016,p.7)  A exclusão das mulheres do discurso sobre fatos históricos é  o sintoma da doença milenar de  sua exclusão da história.

 

 

     O Rio Grande do Sul é   estado de fronteira entre o Brasil e os países platinos  da Argentina e Uruguai , em seu território ocorreram  muitos combates. Nestas lutas  a colônia foi a região que Em 1925, foi elaborado um opúsculo manuscrito contendo as assinaturas dos imigrantes que ainda viviam cinquenta anos após sua vinda da Itália..  Entre estas não há assinatura de nenhuma mulher. Como se os homens tivessem vindo sozinhos para o Brasil e  seus filhos tivessem nascidos sem mãe. Como se os  homens tivessem feito os filhos e a América sem a interferência da mulher, pois nela eram  plantados  alimentos  que eram roubados pelos grupos em luta. Houve momentos de perigo com muitos mortos. 
             Um episódio apenas  foi registrado da ação heroica das imigrantes.Está registrado no adendo que leva o título de  L’opera della donna Italiana no álbum Cinquentanario della collonizzazione italiana nel Rio Grande del   Sud diz o que segue :.    Não é o suficiente ,  exaltar  a altivez  daquela humilde humilde camponesa Rosa Togo  Ragazzon,italiana de Jaguary, que em  julho de 1923 ,ao ver cair morto barbaramente na casa solitária ,pela mão de bandido ,seu  velho sogro indefeso  Ragazzon,com coragem estoica se armou de um forcado  ferindo  o assassino covarde  ,golpeando-o justamente no coração ,derubando-o do cavalo que  montava . (Álbum ,1925 p. 452)” Junto a nota que passa despercebida de tão curta , aparece a foto de Rosa , uma pequena jovem de menos de 20 anos  com o gadanho  na mão .debaixo de algumas copadas árvores ,nas proximidades de um galpão de madeira. 
             Na colônia povoada por imigrantes italianos a mulher teve seus direitos lesados.  O costume de expropriar as mulheres  de seus direitos e de seus abusar do trabalho feminino veio com os imigrantes .Moretto guardou lembranças deste costume “a maior reclamação de Margarida durante a viagem, é de que tinha sempre que carregar as malas. Não sabemos se ele não pagava carregador por economia ou se era por machismo mesmo, pois os italianos tinham o costume de sobrecarregar sempre as mulheres.” (MORETTO, 1991,p. 40)
 
             Infelizmente,  tais costumes ainda se mantém, como observa Picolli ".o desgaste maior cabia às mulheres, que geravam muitos filhos, atendiam a casa e ainda trabalhavam na roça; sistema ainda hoje vigente em muitos casos." (PICOLLI,2001p.30)

 

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[1] Requerimento de 1 de maio de 1904.
[2] Requerimento de 16 de agosto de 1964.

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