MORRER DE AMOR (2)
tTmulos de fFrroupilha |
Quando
éramos pequenas, minha mãe
nos levava a passear no cemitério. Havia então o costume de assistir missa nas nove
primeiras sestas feiras do mês. Minha mãe muito criativa cumpria essa devoção
no cemitério. Eu ficava vendo os túmulos, escolhendo os meus favoritos (criança
consegue brincar com tudo). Eu gostava do túmulo do menino que morrera criança
com odor de santidade (assim era dito). Era bem bonitinho com seu retrato sempre
cheio de flores frescas. Não sei se alguém ainda o cultua, mas naqueles tempos
era venerado, pois que santo. Eu também gostava do rico túmulo da moça que
morrera de regime. Dizia-se que havia morrido de tanto tomar remédio para emagrecer.
Moça tão linda não precisava ser magra. Morrer de fome me parecia um
desperdício.
Mas
meu maior favorito era o túmulo da moça
com jeito antigo de melindrosa. Seu vestido parecia ser de musselina fina (o
vestido de casamento de minha mãe era assim). Uma coroa de flores de cimento
cercava sua fotografia. Ela não morrera de regime, mas de amor. Fiquei
matutando, sobre qual seria a doença que pegara para morrer de amor. Afinal eu
tinha seis anos!
A
cada sesta feira eu perguntava e voltava a perguntar à minha mãe como ela tinha
morrido. Creio que de tanto perguntar (e como eu perguntava) ela respondeu que
tinha tomado pílulas demais. ”Não para emagrecer, mas para dormir”, esclareceu ela.
Voltei a perguntar “por que ela queria dormir”?Irritada minha mãe contou a
história num jato. A jovem morta era noiva de um parente de minha mãe. Segundo disse,
ela agiu mal, por isso seu noivo (o
parente distante) desmanchou o compromisso. Logo eu quis saber o que era
desmanchar compromisso, fiquei sabendo que era não casar. Abandonada a ex-noiva
não resistiu à tristeza e dormiu para sempre. . Daí eu quis saber o que era
agir mal, mas não houve cristo que fizesse minha mãe responder. Fiquei sabendo
também que nossa família (pelo parentesco com o primo) era mal vista pela
família da noiva abandonada. Fiquei pensando, que talvez minha mãe tivesse dado
as pílulas que ela tinha tomado para dormir. Mas, não!
Então,
segundo se dizia às moças que ficavam noivas e que rompiam compromisso ficavam faladas e não casavam mais. Ficar
solteira na Caxias de antigamente era a mesma coisa que ficar empalhada. Eu nunca tinha visto moças
empalhadas, apenas pássaros e bichinhos pequenos. Naquele mundo de sons (afinal,
era a era do rádio) as imagens eram poucas. Eu nunca tinha ouvido falar de
múmias egípcias. Por ser ignorante, achei burra de mais a ideia de moças empalhadas.
Um
dia eu conheci a irmã da noiva morta. Era feia demais. Perguntei à minha irmã, se
a outra a que tomara comprimidos para dormir, não tivera o compromisso rompido
por feiura. Não mereci resposta. Era
assim que eram as coisas ditas, naqueles tempos de antigamente. Cheias de mistérios!
Loraine Slomp Giron Twitter: loslomp Blog :historiadaquiblogspot.com
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