sábado, 30 de novembro de 2013

DEDURISMO




Se há defeito que detesto é o dedurismo. Por sinal não há um bom sinônimo para dedo duro, podem procurar no dicionário para ver. Delator seria o melhor sinônimo, mas é uma palavra pomposa, senta para os grandes traidores como Silvério dos Reis, que delatou a Inconfidência mineira. Delação não é sinônimo de dedurismo, que é coisa menor parecida com um verme. Alcaguete seria outro termo a ser usado, mas tem sentido mais restrito. Seu sentido está m geral ligado aos bandidos que delatam seus companheiros à polícia. Hoje se diz caguete. Mas é muito feio, não é?
            Voltando ao dedo duro, conheci dezenas deles. Fui premiada com a convivência de muitos deles, duvido muito que alguém não tenha sido. Em tempos de ditadura o dedurismo era até uma profissão. Eram chamados agentes disso ou daquilo, mas, na verdade estavam infiltrados para controlar professores e alunos. Alguns até lecionavam para dar mais credibilidade a seu ‘nobre ‘oficio. E como deduravam!
Um dos infiltrados se dizia geógrafo especializado sensoriamento remoto, na verdade não tinha nem o ensino médio, mas, dava aula e levava os imbecis para visitar seu laboratório, fazia churrascos e visitas aos generais acompanhados pelos luminares da instituição. Dai recolhia os dados para o repasse. Tinha outra professora (?) que nem sequer era paga, dedurava por puro prazer. Fazia seu trabalho sujo em sala de aula apontando para os alunos os comunistas do Curso. Depois para completar seu trabalho acusava outros colegas de terem dito o que ela dissera.
Mas não eram só professores, os alunos faziam também o trabalho sujo de dedurar. Um deles gravava as minhas aulas e as repassava no quartel. Outro me disse, em aula, que eu não sabia nada, que tudo o que eu falava era mentira. Quando perguntei como ele sabia disso, respondeu-me que seu patrão o prevenira sobre minha total ignorância. Outro coitadinho me disse (em plena sala de aula) que o tenente lhe havia dito para não acreditar em minhas palavras.  
Mas, como em tudo, a delação também tem duas faces. Para os romanos delatar o mal era prova de civismo. Ou seja, quem delatava o mal feito era um cidadão exemplar, digno de todo respeito.
Como diz Gaspary: "delação premiada” é a conduta de uma pessoa que, tendo participado de um malfeito, decide colaborar com as autoridades em busca de alguma leniência. Quem colabora com o poder público não é um delator, nem a busca da leniência é prêmio. “Será que a delação é uma qualidade”? Dizem que as pessoas nos odeiam outros os próprios defeitos, vai lá saber se não sou uma delatora do passado?

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