UMA CAXIAS COSMOPOLITA (2)
Um
dos novos imigrantes cantava no coral da Catedral. Tinha uma maviosa voz de
tenor. Segundo se comentava seria viúvo. Logo casou com uma jovem que poderia
ser sua filha e continuou a cantar no Coral.
Pouca
gente conhecia seu segredo: no sótão de sua casa tinha um altar votivo, onde
guardava as mais caras lembranças do Duce,
dentre os quais um grande retrato com a camisa negra. Um uniforme completo de
esquadrista, braço armado do movimento, criado em 1919, base de todo movimento.
Enfim, lá guardava as mais caras lembranças do fascio. Periodicamente dedicava parte de seu dia a cultuar seu
herói.
Não
sei como conseguira trazer tais troféus. Coisas de aficionado.
Outro
dos novos imigrantes não tinha um altar, mas trazia o Duce entronizado no coração como se fora uma Sagrado Coração de
Jesus. Qualquer palavra por menor que fosse era suficiente para fazer pulsar o
coração fascista.
Nem
só de fascismo viviam os novos imigrantes.
Uma
de suas mais importantes contribuições foi a culinária. Novos pratos eram
apresentados nas festas de família e logo começavam a ser imitados. Assim o vitelo tonatto virou tatu com molho de maionese
ganhando o nome de vitel tonê. Outro
prato trazido foi o matambre recheado com ovos e ervas finas, que logo se
tornou matambre recheado com linguiça. Afinal o nome vem do espanhol mata hambre, e para matar a fome tudo é
válido.
Outra
receita chegada foi a dos ovos recheados. Creio que esta não precisou ser
reinventada, pois era perfeita. Dou a receita, pois pouca gente conhece. Basta
cozinhar quatro ovos duros, cortar no sentido do comprimento e reservar. À parte faz-se um molho com
tomate, cebola, ervilha misturando levemente com as gemas e colocando uma
colher de mostarda (Dijon, de
preferência). A porção dá para quatro pessoas. É fácil e deliciosa.
Sem
esquecer o maravilhoso estrogonoff,
que logo virou picadinho com creme de leite. Pratos chegados após a Guerra,
juntamente com bebidas diferentes, como os vinhos importados e o run. Novos
coquetéis começam a ser saboreados como Daiquiri e a Cuba Libre, este, em
homenagem a recém iniciada Revolução Cubana. Bons tempos onde ainda se tinha
ideais.
Loraine Slomp Giron –
Historiadora
Twitter: @loslomp
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